segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Bebo porque é líquido, se fosse sólido comê-lo-ia.


A frase é atribuída a Jânio Quadros em um episódio onde um jornalista perguntou o motivo de beber tanto. Pois bem se Jânio fosse vivo isso não seria mais um problema. Agora é possível comer “bebidas” como caipirinhas, e outros drinks. Atualmente, algumas revistas de entretenimento e lazer tem apresentado os drinks da moda e muitos deles são baseados na gastronomia molecular. Na verdade, bartenders tem usado ciência nas suas coqueteleiras, embora talvez não saibam exatamente como. De qualquer forma, a possibilidade de solidificar uma bebida clássica traz uma novidade interessante a uma receita simples. Provavelmente os mais conservadores não aprovam essas variações. De fato, a invasão de receitas baseadas em conhecimentos científicos sobre química, física e biologia tem modificado o cenário e as receitas por detrás do balcão. Assim, pode-se obter hoje nitrogênio líquido para atingir temperaturas muito baixas, soluções com alginatos e sais de cálcio para se fazer esferas que viram uma espécie de caviar alcoólico (ou não)... Legal, né?
É saudável a discussão sobre a forma com que essas novidades tem surgido e impregnado as cozinhas de profissionais e amadores por todo o mundo. Modismo ou não, os criadores da gastronomia molecular tinham o interesse de resolver problemas simples das receitas gastronômicas. Nas palavras de Nicolas Kurti um dos fundadores das reuniões em Erice na Itália que albergam 40 Chefs e cientistas para discutir a ciência na cozinha: “Sabemos mais a respeito da distribuição de temperatura na atmosfera de Vênus do que no interior de um suflê” (mais sobre esse evento pode ser lido no interessantíssimo A ciência no Cotidiano de Len Fisher). O fato é que da maneira com que a gastronomia molecular é feita hoje, onde compra-se os produtos e receitas dos grandes líderes desse movimento, dificilmente teremos realmente o conhecimento científico sobre o procedimento a serviço dos chefs que, a princípio, poderia favorecer a discussão detalhadas de receitas e o apuro completo do processo. Mas o que fica e a pergunta: será que esse conhecimento é realmente necessário? Talvez apenas o saber fazer seja suficiente para a maioria. Claro que alguns precisam tentar entender e explicar os fenômenos científicos por detrás das porque facilitariam o avanço das receitas. Será mesmo? Durante quanto tempo vivemos sem a gastronomia molecular. Gosto de pensar que entender, explicar e justificar o mundo é uma obsessão humana, mas ela definitivamente não é necessária. Até ajuda bastante, mas necessária não é!
Polêmicas a parte, para fazer uma caipirinha sólida é simples basta misturar gelatina ou ágar (que é um açúcar derivado de algas que é o mesmo produto que se usa para fazer aquelas balinhas de alga vendidas em lojas de produtos naturais). A vantagem do ágar é que ele fica sólido a temperatura ambiente. A gelatina também apresenta a mesma consistência, mas alguns minutos a temperatura ambiente ela ficará líquida. A diferença está no ponto de fusão da gelatina e do ágar, ou seja, a temperatura que o líquido se solidifica. Para fazer caipirinha de ágar basta misturá-lo com água (uma colherzinha de sobremesa cheia para meio copo de água. Depois leve ao microondas por 1 ou 2 minutos e deixe esfriar um pouco. Depois adicione suco de limão, açúcar e cachaça a gosto (normalmente dois limões espremidos, duas colheres de chá de açúcar e duas doses de cachaça fazem muitas balinhas).
Bom agora é deixar esfriar a temperatura ambiente ou na geledeira. Boa caipirinha nova.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Cozinho com vinhos. De vez em quando até o coloco na comida










A citação que ilumina essa crônica é de W.C. Fields (1880-1946) que foi ator e comediante norte-americano. Retirei-a da agenda gourmet 2009. Na verdade essa frase é a síntese do último jantar que eu e Mauro preparamos. Um grande amigo nosso, Stevens “Bitty” Rehen, fez aniversário e oferecemos para ele um jantar. Na verdade, se eu soubesse com antecedência que seriam 40 convidados teria pensado duas vezes antes de me prontificar a cozinhar. Nada demais... Entretanto para alimentar 40 pessoas são necessárias algumas providências para evitar surpresas. De qualquer forma, resolvemos fazer pratos simples: um Buccattini a la matriciana e dois risotos: um de carne seca com abóbora e outro de funghi. Como sabíamos que seria uma pequena tropa em uma sexta feira, resolvemos deixar molhos e outros ingredientes pré-cozidos para acelerar o processo. Assim, Mauro curtiu seu delicioso molho de tomate levemente adocicado em fogo baixo por 3 dias. Claro que o processo envolve vários estágios, onde o molho depois de “quase” pronto vai e geladeira e ao fogo baixo em intervalos de 4-5h por dia (normalmente a noite). No dia bastou fritar o bacon misturar e cozinhar o buccattini! Excelente... Primeiro prato elaborado em 30 minutos e servido aos ansiosos convidados imediatamente. Não durou nem 5 minutos. Foi chegar e servir! Cinco quilos de molho de tomate em 0,5kg de bacon e 2 kilos de macarrão sumiram num piscar de olhos.
Fomos ao segundo prato, mas não sem antes abrir um vinho! Embora o Bitty seja um grande amigo ele é conhecido pelos antigos companheiros por delegar tarefas e com isso não fazer nada. Foi o que aconteceu na festa. Helena Borges, a esposa, comprou e compôs a mesa de frios, eu e Mauro preparamos tudo para o jantar e o Bitty se divertiu. Tudo bem, era seu aniversário, mas tínhamos que aprontar-lhe alguma. Estávamos cozinhando no apartamento e a festa acontecendo no playground. Quando subimos para o segundo prato, Helena nos perguntou se queríamos um vinho dissendo que tinha uns tintos especiais reservados no apartamento. Não titubeamos! Era nossa vingança. Helena rapidamente percebeu que cometera um engano, mas não havia mais saída. Tomamos de assalto e revistamos o apartamento. Encontramos um Bordeaux que nos deixou saudade porque foi consumido quase em tempo real. Bom, ainda tínhamos que cozinhar. Levei a carne seca (1kg) desalgada, escaldada e desfiada. A abóbora (1kg) estava apenas cortada em pedaços para 1kg de arroz arbóreo. Daí, fiz o procedimento de rotina, dourei duas cebolas picadas em manteiga no fogo alto e misturei o arroz que foi refogado por dois minutos. Adiciona-se 400ml de vinho branco de boa qualidade e a partir desse ponto o arroz precisa ficar em constante movimento. Até a evaporação quase completa, e, então, se adiciona o caldo de carne (comercial mesmo diluído na água de cozimento da abóbora) aos poucos e junta-se a maior parte da abóbora (reserve um pouco para ficar em pedaços). Cozinha-se o arroz dessa forma por 15-18 minutos e adicione a carne desfiada (ela já deve ter sido refogada na manteiga com cebola) mais manteiga e queijo parmesão. A dica é colocar uma série de ervas de tempero como alecrim, orégano fresco, tomilho e manjericão. Cria um bouquet fenomenal e contribui para o frescor do prato. Taí um prato para ser servido para muitos em pequenas porções que fez a alegria da garotada!! Na verdade, todo o processo deu uma trabalheira, mas a felicidade de um grande amigo é realmente impagável. E convenhamos festas regadas a boa comida e excelentes vinhos dificilmente dariam errado...




Vejam também os vídeos que talvez exemplifiquem em imagem essa confraternização (http://www.youtube.com/watch?v=YApvhvh7u1A; (http://www.youtube.com/watch?v=IdOUdg6-46U). Talvez a imagem aí do lado da Juliana saboreando o risoto também seja um bom exemplo! Que venham mais festas e encontros. Afinal, cozinho com vinhos: na comida e na corrente sanguínea!




segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Um prato tailandês para o verão do Rio. Será que combina?

Nessa época do ano, os sites especializados de culinária e as colunas de gastronomia costumam publicar receitas de verão, como se estivéssemos obrigados a comer apenas receitas leves e harmonizadas com o clima quente. É tempo também de vários colunistas defenderem o vinho branco, o espumante e o vinho rosé. Nada contra, mas depois de diversos avanços tecnológicos como, por exemplo, o ar condicionado, não há porque ter hábitos alimentares restritivos no verão. Claro que não defendo o churrasco ou a feijoada em uma noite úmida de 35oC. Afinal, mesmo que o ambiente esteja climatizado, seja em casa ou em um restaurante, na saída pode-se haver surpresas! De qualquer forma, não é absurdo termos situações intermediárias, onde os pratos principais não são os velhos conhecidos da temporada como as sopas frias ou saladas. Uma das boas pedidas que ficam nesse intervalo é a comida “tailandesa” que está ente aspas porque aqui, no Brasil, tem sido rapidamente absorvida e transformada. Neste aspecto, as receitas tailandesas e indianas se misturam e os temperos precisam ser adaptados para o cozinheiro de casa. Um filé mignon em curry vermelho abrasileirado é uma receita de fácil execução e extremamente saborosa.
Para se fazer curry vermelho, basta fazer um molho de tomate com ½ kg de tomates pelados e sem caroço (pode-se cozinhar e bater no liquidificador para facilitar o processo). Depois de peneirado adicione ao molho: 1 pimentão vermelho inteiro sem caroços, um pedaço de gengibre (pequeno), pedaços inteiros com folhas e caules de coentro (salve algumas folinhas para decorar o prato no final) e também cebolinha (um molho de cada é suficiente). Ainda bata a pimenta dedo de moça, que deve ter os caroços retirados, e ainda, deverá repousar em água fria por 20 minutos. A quantidade de pimentas deve ser definida pelo o quanto “quente” as pessoas querem o seu prato. Duas pimentas é uma quantidade leve. Se cinco ou mais pimentas forem usadas a sensação de ardência será deliciosamente inevitável. Adicione ainda 3 colheres de Shoyu e ainda uma colher de óleo de gergelim torrado. Bata tudo até ter um molho homogêneo e reduza o volume a 2/3 do total (deve estar com um aspecto espesso) em fogo baixo.

Paralelamente, Deixe o 1 kg de filé mignon partido em pedacinhos (como se fosse o picadinho) repousando por 30 minutos em pimenta do reino moída.


Corte uma cebola grande e 3 dentes de alho. Em uma panela grande como a wok, refogue as cebolas e depois o alho em azeite (ou óleo de gergelim torrado ou até mesmo uma pouquinho de azeite de dendê pode ser utilizado nessa fusão inusitada) e refogue, então, o molho. Abaixe o fogo e “curta” por 5 minutos. Adicione sal à carne, derrame na wok, e, cozinhe por 2-3 minutos. É muito importante o tempo de cozimento, pois após muito tempo a carne perde muita água e, consequentemente, a maciez e suculência. Claro que dependendo do tamanho dos pedaços o tempo requerido pode ser maior ou menor. A dica é espetar um pedacinho de carne e prová-la! Para terminar adicione as folhinhas de coentro e uma garrafinha de leite de coco. Ainda é opcional adicionar frutas como abacaxi ou carambola. Se quiser, esse é momento! Está pronto para servir. Claro que a carne pode ser substituída por camarão, frango, lula, cordeiro ou mesmo tudo junto. Tenho que confessar que tudo junto nunca provei! Um acompanhamento necessário e uma invenção interessante para cortar a pimenta é o arroz Basmati que pode ser feito apenas na água e sal ou pode ser feito do jeito tradicional refogado na cebola e no alho. Adicione 3 copos de água fervente para um copo de arroz (ele pode ficar levemente grudento). Salpique folinhas de salsa por cima do arroz depois de pronto. Uma bossa especial é fazer o arroz croc-croc do Claude Troisgros. Para isso, basta fritar arroz preto selvagem por alguns segundos secar, salgar levemente e jogar por cima do arroz basmati. Uma variação para acompanhar é o macarrão. Simples para misturar ao molho depois!

Para beber? Caipifrutas com muito gelo (misture uns raminhos de hortelã antes de amassar o limão que o resultado é divino, gengibre em conserva e manjericão também agradam), cervejas encorpadas como a Weinhenstephaner de média graduação alcoólica (7,7%) são sempre excelentes opções. Ainda, vinhos tintos jovens de uvas malbec, merlot, ou pinot noir como os franceses da Borgonha de baixa graduação alcoólica (11-12,5%), por exemplo, também formam um bom par!
Tudo bem que no verão pimenta e vinho são bem vindos, mas não abusem e bebam muita água! Bon apetit.