domingo, 23 de dezembro de 2007

Pequenas neuras de um Chef amador




Não sei se isso acontece com vocês, meus amigos, mas depois que eu comecei a me aventurar pelas vielas de frigideiras, tabuleiros e colheres de pau cada vez que visito um restaurante faço uma brincadeira com meus amigos de mesa que se chama: tente descobrir os ingredientes! A idéia é que quando gostamos do prato, tentamos adivinhar e reconhecer quais são os temperos e demais produtos utilizados no preparo daquela receita.
Jantamos no “Nam Thai”, restaurante tailandês no Leblon e comendo um mix de entradas fiquei entretido na manga com trutas defumadas.
Percebi rapidamente os ingredientes óbvios como a truta defumada, a pimenta dedo de moça e a manga (de verde para madura), a amêndoa fatiada e os temperos verdinhos (cebolinha). Tudo servido em uma “concha” de repolho roxo. Na semana seguinte tive a chance de cozinhar para os amigos e decidimos fazer um jantar indiano. Eu me dispus, prontamente, a preparar a manga verde com truta defumada que é uma receita tailandesa, mas fica no mesmo continente! Para não pagar mico precisava ainda descobrir alguns ingredientes e testar outros. Também precisava ter certeza do ponto da manga e também a melhor forma de apresentar a truta. Então resolvi cozinhar para Dani, a patroa, que acaba sempre servindo como cobaia (felizmente ela não tem reclamado). Descobri que deveria tentar achar o molho de peixe para temperar, mas como não achei usei um óleo de gergelim comprado no supermercado Zona Sul. Daí estava com a maioria dos ingredientes definidos e o restante fica por conta dos devaneios de Chef amador e cientista curioso, ou seja, tentativa e acerto. Fiz em casa e a Dani aprovou!
Daí foi só adaptar a receita para 6 pessoas. Basta fatiar em um processador 3 mangas médias Hayden que devem estar duras (se estiverem com consistência de maduras não é possível fatiá-las). Tire a pele de 150g de truta defumada, frite, desfie e reserve. Abra 6 pimentas dedo de moça e retire os caroços. Corte ao longo (caso você goste de temperos mais “quentes” use mais pimentas ou mesmo os caroços). Fatie cebolinha a gosto.
Misture todos esses ingredientes. Não esqueça de adicionar a amêndoa fatiada (+/- 80g). Para temperar use o óleo de gergelim, uma pouco de Shoyu e o suco de um limão. Sirva nas conchinhas de repolho roxo. Ah, é uma entrada ótima para comer acompanhada de uma cerveja ou mesmo um espumante bem gelado. Tenho certeza que a receita original deve ser bastante diferente, mas isso não importa mais porque a adaptada ficou deliciosa. Agora o desafio é descobrir a próxima receita.

Molhos e temperos para saladas: da fazenda direto para sua casa.

Há um tempo, o Mauro Rebelo escreveu aqui que a boa escolha dos ingredientes pode definir o sucesso de um prato. Isso é verdade para um molho de tomate de um macarrão ou para um simples molho de salada.

Hoje, temos uma diversidade enorme de temperos e folhas que nos possibilitam combinações variáveis e descobertas maravilhosas. Claro que, mais uma vez, tudo começa com escolha dos ingredientes.

No caso de saladas, o frescor das folhas é garantia de qualidade. Descobrimos recentemente o hortomercado de Itaipava. Uma delícia! Uma dessas visitas gastronômicas que funcionam como uma espécie de aperitivo da refeição, um verdadeiro almoço visual. Tem alface crespa, roxa, americana... Tem ainda shitake, shimeji, tudo fresquinho. Pode escolher! Se quiser podemos comprar os brotinhos para cultivar em casa. A excitação visual era intensa de forma que ficamos enfeitiçados e começamos comprar de tudo um pouco: flores, temperos para carnes (sálvia, manjericão, orégano), e, depois escolhemos as folhas para a salada. Voltamos para casa correndo para comer porque a fome derivada dessa experiência sensorial já era incontrolável.Montamos uma salada para 10 pessoas com verdes como rúcula, agrião, alface crespa e roxa. Salpicamos queijo parmesão. Depois fizemos o molho misturando 1 colher de sopa de mostarda com 1 colher de sopa de “aceto balsâmico” e 1 colher de sopa de mel. Adicionamos sal a gosto e mexemos até formar uma pasta homogênea. Em seguida, adicionamos 250ml de azeite em fio, batendo com chicote até ficar bem cremoso. Acrescentamos nozes picadas e manjericão picado. O resultado é fabuloso. Uma salada simples que é uma entrada saudável com gostinho da fazenda. Experimente.


sábado, 29 de setembro de 2007

mordidas sonoras

Li recentemente o delicioso livro de Alex Kapranos, vocalista do Franz Ferdinand. Alex é um desses ingleses que fez de tudo um pouco na vida. Trabalhou em restaurantes em todos os níveis. Foi entregador de comida, bartender e chef de cozinha. De repente perto dos 30 anos resolveu abdicar de tudo para se dedicar a mais uma de suas atividades: a música. Alex juntamente com um companheiro de cozinha e outros amigos criou o Franz Ferdinand em 2001. Devido a toda experiência adquirida nas cozinhas do Reino Unido o The guardian ofereceu-lhe uma coluna para falar das histórias da culinária por onde o Franz passava em sua turnê mundial. Mordidas sonoras é a coletânea desses textos. Rio, Buenos Aires, Londres, Paris, Seattle, Los Angeles, Nova Iorque, Sydney e outras tantas cidades. Com um texto bem humorado e jornalístico Alex foi capaz de absorver a atmosfera de todos esses lugares. Claro que no Rio ele fala de uma churrascaria, e em Osaka fala de sushis de baicu. Entretanto, Alex foge do lugar comum e captura cada cidade através dos restaurantes: a localização, o cardápio e seus personagens (garçons, chefs e clientes). Textos maravilhosos que dão água na boca como o que ele fala do dia que visitou Sergi Arola do La Broche em Madri. Sergi é um desses chefs que estão abalando os pilares gastronômicos por modificarem os tabus, leia-se: texturas, essências, espumas.
Já falei deles aqui quando comentei que fazer pesquisas científicas ou cozinhar não é diferente.
A grande virtude de Alex Kapranos é que o texto desperta em nós uma série de lembranças e experiências parecidas com as que ele teve em diferentes lugares do mundo. Por isso, o livrinho (tem apenas 150 páginas) foi lido lenta e deliciosamente, da mesma maneira que cozinhamos uma costela no bafo. Após cada capítulo, cada cidade, precisei de alguns minutos para lembrar das minhas próprias experiências. Foi o que aconteceu quando Alex falou da passagem por Seattle onde um amigo da banda, Paul Thomson, resolveu experimentar ostras. A conclusão é que, na percepção de Paul, esses pequenos bivalves marinhos tem consistência de lula, mas granulosa. Tive a mesma impressão quando provei ostras pela primeira vez. Eu gostei, Paul, não, e, quando Alex perguntou a ele se provaria as ostras de novo Paul respondeu: “Cheguei uma idade em que, se existir algo que não provei, provavelmente tem uma boa razão para isso”.

domingo, 23 de setembro de 2007

Estratagema






Há alguns anos, li uma crônica do Luís Fernando Veríssimo que se chama estratagema. Ele dizia que ao longo dos anos havia desenvolvido uma estratégia para viver mais tempo. Basicamente, ele comprava mais livros do que ele era capaz de ler durante a curta e atribulada existência dele e, esperava que o acúmulo de livros pudesse garantir-lhe algum tempo extra até que conseguisse terminá-los. Eu compartilho integralmente a opinião do mestre Luis Fernando. A diferença é que eu faço isso com livros e VINHOS! Argentinos, Chilenos, Italianos, Franceses, portugueses, Espanhóis... Não importa. A beleza de guardar vinhos com a esperança de aumentar a expectativa de vida se resume a deliciosa sensação de esperar por grandes encontros. Uma boa compra gera grandes expectativas para o dia especial de consumir a mais nova aquisição. Vinhos são marcantes. Como os livros, os vinhos trazem consigo características que geram memória. Marcam uma data, um bom jantar, ou apenas revelam um grande descoberta, o próprio vinho. Alguns dias que seriam comuns se tornam magníficas lembranças por causa de uma revelação. Tem gente que faz planilha excel, que guarda os rótulos, as rolhas ou, ainda, escreve suas experiências em diários. Todo o processo é memorável. A busca pelos vinhos é, por si só, um deleite. A tranqüila caminhada por entre as estantes observando calmamente as garrafas expostas, convidativas, diria até oferecidas, é uma espécie de garimpo onde tesouros se escondem. Tenho a clara a sensação de que os garrafas se mexem e falam com você. Algumas delas acabam colando na sua mão. Fito o rótulo, e, em um breve flerte, estudo as propriedades descritas e verifico o preço. O encontro é rápido e intuitivo. Como se estivesse lendo uma orelha de livro e já soubesse o conteúdo. Curto o espaço como o de uma livraria. Ouço, ainda, as dicas dos sommeliers residentes e, finalmente, seleciono algumas garrafas. Volto feliz para casa. Sensação de dever cumprido. Afinal, aumentei o estoque, promessa de vida longa. Pelo menos enquanto mantiver o estratagema!

terça-feira, 4 de setembro de 2007

I Risotti

Existem alguns grandes engodos na baixa gastronomia brasileira. Um deles é o risoto. Todos nós fomos enganados (e continuamos sendo) quanto ao que é, de verdade, o risoto. Alguns dos bares e botequins autênticos da baixa gastronomia carioca que têm exemplares como o Tia Salete e o Siri, ambos na Tijuca, servem indiscriminadamente arroz de camarão chamando de risoto de camarão. Uma lástima. Não que seja ruim. Muito pelo contrário. São pratos saborosíssimos! Infelizmente não é risoto.

O risotto é um prato feito com arroz italiano (principalmente o carnaroli) que precisa de um cozimento em fogo alto e muito jeito e energia para girar sem parar uma colher de pau mexendo o arroz por uns 20 minutos. O preparo é simples, mas requer uma pouco de experiência para conseguir acertar o tempo de cozimento com a consistência do arroz e o molho em excesso que dá um sabor e uma textura especiais. É isso mesmo não se assustem! O bom risoto não fica sequinho. Não disse que tinham te enganado? O arroz desprende amido durante o processo de feitura com o movimento freqüente da colher de pau. Com isso, o risoto vai ganhando um aspecto de arroz empapado que nesse caso funciona.
O Risoto, como diz o grande Chef Luciano Baseggio em seu livro “Il riso in tasca” é um prato completo e muito versátil. O risoto pode ser servido até como entrada, mas normalmente me agrada a idéia de fazê-lo como prato principal acompanhado ou não de uma carne. Há risoto de frutos do mar, carnes, funghi, pato, ou apenas alla parmigiana. O “alla parmigiana” não é exclusivo do risoto que leva o seu nome todos eles carregam grandes quantidades de queijo parmesão e manteiga. Esqueçam as calorias e não desanimem!
Outro dia cozinhei um simples risoto al Funghi porcini (receita adaptada do livro que citei acima) como primi piatti para celebrar o aniversário do amigo Mauro. Como era uma entradinha servimos pequenas porções para 10 pessoas e deu... Vamos ao que interessa: Dissolva 4 pacotes de caldo de carne em 2 litros de água e deixe ferver. Há aqueles que preferem fazer o seu próprio caldo. Entretanto, depois que eu vi a dica de Miguel de Carvalho, o magnífico, dizendo que os caldos prontos são muito adequados eu substituí e, pasmém não faz muita diferença. Lave 80-100g de funghi porcini secchi e amacie em 200ml de água morna por 30 minutos. Reserve a água. Triture 2 cebolas grandes e refogue em 2 colheres de manteiga. Adicione o arroz (½ kg, carnaroli) e o porcini drenado e refogue por alguns minutos. Adicione 2 taças de vinho branco de boa qualidade. Mantenha o arroz refogando. Comece a mexer. A partir de agora não pode parar mais! Quando começar a secar adicione o caldo (misture a água reservada do porcini com o caldo). Cozinhe por 16-17 minutos mexendo sempre. Não coloque caldo em excesso perto do fim. Adicione mais 2 colheres de manteiga e uma xícara grande cheia de parmesão (ou grana padano, uns 250g) ralado. Misture bem e sirva imediatamente. esse prato acompanha vinhos leves. O Vino Nobile de Montepulciano é sempre uma boa pedida, mas para bolsos menos previlegiados (como o meu) preferimos um banho de Malbecs e Merlots argentinos, e Carmenére Chilenos. Destaque total para o Andeluna Merlot 2004. Depois que os merlots foram achacados no bom filme sideways eu fiquei com pena e comecei a beber mais dele. Até porque os preços caíram um pouco. Especialmente os varietais. Esse Andeluna é uma coisa! Macio e bem equilibrado, sem adstringência exagerada e bouquet rico. Gostoso só de ficar cheirando!

Outro grande pecado feito com o arroz no Brasil é também uma tentativa de risoto: o arroz à piamontese. Uma espécie de risoto pobrezinho... Mas isso é outra história.

domingo, 26 de agosto de 2007

Entradinhas

Há pequenas coisas que são capazes de distinguir de maneira significativa um bom jantar de um jantar mediano. Uma dessas pequenices é uma boa entrada. Talvez uma das mais simples seja a Bruschetta italiana. A receita tradicional é a base de salada de tomate com manjericão que recobrem uma fatia generosa de pão italiano. Uma delícia... Claro que atualmente vários restaurantes apresentam variantes das Bruschettas tradicionais. Algumas levam queijo Brie com tomate seco e rúcula ou outras combinações ainda mais extravagentes. Nada me convence que essas mutantes sejam melhores que a Bruschetta clássica. Curiosamente, na Espanha se come o “pan con tomate” que é uma “Bruschetta-like” dos nossos amigos da península Ibérica.

Outro dia no jantar italiano da nossa Confraria fizemos Bruschetta de entrada, obviamente. A receita é realmente muito fácil e rápida: um pão italiano cortado inteiro com 1 dedo de espessura, onde esfregamos uma cabeça de alho cortado. Essa é uma boa dica porque agrega o aroma e o sabor do alho sutilmente sem que fique partes de alho na mistura já que não são todos que gostam do forte sabor de alho quando cortado em pedacinhos. O pão cortado é distribuído em um tabuleiro regado com azeite e levado ao forno por 10-15 minutos ou até dourar levemente. Não deixe torrar demais. Cortamos em pequenos pedaços 6 tomates médios, sem sementes, bem maduros e misturamos com sal e azeite extra-virgem a gosto e 20 folhinhas de manjericão. Esse molho é então utilizado para “rechear” o pão que pode ser servido imediatamente.
Neste dia, acompanhamos a Bruschetta com uma espumante da Lídio Carraro (reserva da Serra, Brut, de uvas Chardonnay e Pinot Noir). Uma boa escolha especialmente por se tratar de uma tiragem especial dos jogos Pan-americanos. Um espumante bem macio e leve. Excelente para abrir os trabalhos da noite. Claro que não ficamos só nos espumantes Brasileiros.
Rapidamente provamos um, dois ou três (não lembro ao certo) Proseccos Valdobiedenne, afinal o jantar era Italiano. Também muito bons! De fato, uma respeitável início para uma bonna note italiana. Arrivederci!

domingo, 29 de julho de 2007

Os ingredientes


Tem um livrinho que eu comprei na Itália chamado "Cuochi si diventa" (Allan Bay, ed Feltrinelli) que traduzido quer dizer: Ninguém nasce cozinheiro!

Nem guia pra se tornar um chef, existe um capítulo inteiro dedicado aos ingredientes. Um bom jantar, começa na feira e no supermercado. Uma vez conversando com o garçon em restaurante italiano ele disse: "compre tomates de 1 dolar, e terás um molho de 1 dolar. Compre bons tomtes e terás um bom molho".

Tenho trabalhado arduamente na tentativa de fazer o melhor molho de tomate do mundo e descobri que não podemos fazer um molho de tomate quando queremos. Tem de ser quando os tomates aparecem. Eu vou ao mercado e um dia olho para a banca dos tomates e digo: "É dia de molho!" Ligo pros amigos e eles já sabem que dentro de 4 dias, o tempo de preparo, estaremos aptos a marcar o jantar.

Não foi diferente dessa vez. Quando vi esses tomates na Cobal, sabia que o próximo encontro de nossa confraria teria macarronada. Estavam maduros no ponto, bem vermelhos e perfumados.

O cozimento, ao contrário do que a minha formação científica sugere, é mais uma arte do que uma receita.

Coloco em geral 4 cebolas grandes para 3 kg de tomate. Uma quantidade enorme de alho. Cozinho o refogado separado. O azeite de oliva quando cozido por muito tempo começa a formar compostos fenólicos que podem deixar gosto ruim na comida. Se vai fritar alguma coisa, por mais que o azeite virgem pareça a opção mais chique, não é necessariamente a melhor. Opte pelo velho e bom óleo de soja, ou de arroz. Eu uso de canola, que é tão saudável quanto o de oliva e muito mais barato. As quantidades homéricas de alho e cebola ficam então refogando até ficarem bem bronzeadas.


Enquanto isso os tomates foram descascados e descaroçados. Essa é uma etapa importante porque tanto a casca, quanto o caroço podem atrapalhar o aspecto, a facilidade de comer (sem os fiapos que a casca vira) e o gosto (amargo dos caroços). Você pode usar duas táticas para despelar e descaroçar. A mais recomendada e colocar os tomates no forno, que também tira a 'água da fruta' a água do próprio tomate, que segundo alguns autores pode causar também, algum amargor. Eu nunca notei, e sempre uso colocar os tomates em uma panela com água fervendo por alguns minutos. A casca sai quase inteira. Depois tiro os caroços e coloco os tomates, sem picar, mas sem estarem inteiros, na panela e deixo cozinhando sozinhos.

É bom colocar um pouco de açúcar pra quebrar a acidez (1- 2 colheres de sopa cheias) e depois sal. Deixa cozinhar bem. Depois, da mesma forma que se tempera o feijão, adiciono o refogado de alho e cebola. A seguir vem o manjericão seco e óleo de oliva.

Finalmente, olho para minha coleção de temperos e... de acordo com o meu humor posso colocar nós moscada, pimenta preta e outras combinações.


Cozinhar por algumas horas e depois deixar o molho descansar, a frio de preferência (dentro da geladeira) é o pulo do gato. As reações químicas que acontecem com o passar do tempo, especialmente a frio, ajudam a encorpar e apurar o sabor, sem estragar o molho. Isso também sugere que congelar não estraga, apenas melhora, o molho.

O resultado, como vocês podem ver, foi um espetáculo que degustamos com várias garrafas de Prosseco.

Ciência & gastronomia: os cientistas são cozinheiros. Os Chefs também precisam saber ciência?

A arte de cozinhar exige vários conhecimentos científicos que na maior parte das vezes é intuitivo. Vários livros sobre o assunto já foram publicados como: “O que Einstein disse ao seu cozinheiro” (Robert L. Wolke, Jorge Zahar). Lá é possível descobrir que o chocolate derrete nos seus dedos porque a temperatura de fusão do chocolate é de 36,5oC e como a nossa temperatura corpórea é 37oC quando seguramos o chocolate ele rapidamente começa a se fundir... Várias outras questões dos por quês até as dicas de "como fazer" seguido das justificativas químicas, físicas ou biológicas podem ser encontradas nesse livro.

Entretanto, não é esse o meu objetivo aqui. Na verdade, uma questão interessante em gastronomia é que normalmente se associa a atividade dos chefs a grande capacidade criativa, mas dificilmente se valoriza o rigor científico que eles estão sujeitos para conseguir atingir aqueles objetivos iniciais. Uma receita nada mais é do que um procedimento detalhado para se realizar um prato. Claro que existe uma diferença entre grandes Chefs e cozinheiros honestos. Talvez a arte se esconda exatamente aí! Por que a qualquer receita pode estar escrita em um livro.

O que estou querendo dizer é que artistas, como os Chefs de cozinha, também são cientistas . Por outro lado, os cientistas também são cozinheiros porque para fazer experiências científicas eles normalmente seguem receitas. A grande diferença é que não se pode comer o resultado das experiências no final.

A analogia é importante. Vejam o referencial do Chef se pudermos compará-lo ao cientista. Começamos com as boas ferramentas: os apetrechos podem até ser de grande simplicidade como as panelas de barro e colheres de pau. Entretanto, Chefs que se prezam tem também a disposição centrífugas, processadores e outros equipamentos da mais alta tecnologia. E os ingredientes? É fato que os melhores Chefs tem sempre a mão uma miríade de produtos extraordinários, fonte inesgotável de prazer para cozinhar e deixar-se seduzir pelo resultado final do preparado. As receitas são verdadeiros protocolos que especificam cada etapa do procedimento: dos ingredientes requeridos à ordem com eles são misturados. Chefs ainda usam um “jaleco” branco. Altamente científico!
Então por que que quando seguimos as receitas do Miguel o magnífico, Oliver, ou do "Doutor" José Hugo Celidônio (eles certamente deveriam ter o título de doutorado em gastronomia se chegarmos a conclusão de que culinária é uma ciência) muitas vezes percebemos que o resultado é apenas razoável? Talvez o ponto seja esse, que, curiosamente, também existe nos cientistas... a mão, ou seja, a habilidade de conseguir traduzir todos aquelas regras passo-a-passo em um perfeito e suculento Steak a poivre... Simples assim.


Poxa, mas está ficando complicado. O esteriótipo dos cientistas é normalmente o de profissionais objetivos, altamente qualificados e a prova de erros. Bobagem... Bons cientistas precisam daquele “algo a mais” para transformar uma boa “receita” em um experimento de bons resultados... Da mesma forma que os Chefs!
Será que essa habilidade, a “mão-de-Chef”, é o que chamamos de criatividade? Acho que não. Segundo Domenico de Masi, a criatividade é “a combinação de fantasia e realização”. A capacidade de romper com os conceitos estabelecidos, fundindo, inovando, multiplicando o saber.

Em culinária moderna um exemplo atual de criatividade éa a gastronomia molecular do Chef espanhol Ferran Adrià do “El Bulli”. Adrià ganhou termo no Wikipedia. E é conhecido por experimentos que rompem os conceitos convencionais de texturas e sabores que são elaborados em seu laboratório/oficina chamado de “El Taller”. Segundo a Time magazine Adria é um das personalidades mais influentes do século 21. Contudo, a gastronomia molecular é uma forma mais rigorosa de cozinhar, onde os testes sobre a maneira de selar um bife, por exemplo, são avaliadas cuidadosamente com comparações entre grupos de bifes fritos a temperaturas diferentes (Veja mais no sítio de gastronomia molecular e a ciência da culinária aqui .

De qualquer forma, não é a idéia do rigor científico que torna Adriá criativo, mas a capacidade de fazer um bife com textura de gelatina que rompe o conceito de bife e também da gelatina!! Chefs e cientistas normalmente usam algum rigor e suas mãos hábeis para produzir grandes experimentos, mas esse processo embora bem registrado é sempre muito intuitivo e a capacidade de observar, abstrair e fazer analogias (ver mais em Centelhas de Gênios Robert e Michelle Root-Bernstein, Nobel editora, 2001) que modifica uma teoria, uma forma de pensar, uma maneira de riscar traços em uma tela ou fazer um bife. Isso é a criatividade comum a cientistas, artistas, Chefs, músicos, etc. E não é só isso! Toda a rotina de execução também é comum... É talvez seja isso! Não há diferenças entre arte e ciência. Não há diferenças entre cientistas e Chefs. A não ser que consideremos que a diferença no final se baseie no uso do chapéu...

domingo, 22 de julho de 2007

A vingança dos Argentinos

A despeito da rivalidade eterna entre Brasileiros e Argentinos, especialmente no futebol, não podemos negar algumas grandes qualidades dos nossos Hermanos! Boa educação, música, literatura e cinema de primeiro grandeza e certamente uma gastronomia de excelência. Carnes de nível invejável que apreciamos nos cortes consagrados no Brasil, mas que a origem argentina são decididamente melhores. Para finalizar ainda temos os vinhos. De primeiro time. Para organizar uma jantar com o tema Argentina é fácil. Primeiro basta escolher bem a carne: picanha maturada. Não sei se todos sabem, mas o processo de maturação nada mais é do que a manutenção da carne a baixas temperaturas por um período de 30 dias que leva a um suave degradação protéica acentuando a maciez devido ao rompimento das fibras. Temperamos com molho Chimi-churri que é um mistura de ervas, alho, cebola, pimenta com azeite e outros coisinhas (usamos o molho pronto Epicuro de muito boa qualidade). Uma característica especial desse dia foi que um dos assessores para assuntos gastronômicos desse blog, Mauro Rebelo, ficou responsável pelas picanhas e acabou deixando-as congeladas. Como o grupo estava faminto resolvemos seguir em frente. Com isso, após aquecer a churrasqueira em brasa alta fizemos cortes grossos de 3 dedos de espessura e colocamos no fogo. A picanha não foi salgada, pois um amigo argentino me disse que lá eles salgam a carne depois de assada com sal fino. De certa forma faz sentido, pois mantém a carne hidratada que se traduz em suculência para os carnívoros sedentos. Desta forma, a carne atravessa um lento processo de desnaturação térmica das proteínas, que quando bem feita significa maciez (lembre-se que a carne que usamos era maturada, ou seja, a carne fica muito, muito macia). O resultado final foi interessante porque a carne sem sal ainda congelada levada a churrasqueira selou rapidamente e descongelou e cozinhou simultaneamente. Ao final de 40 minutos de preparação tínhamos uma picanha mal passada, e suculenta. Depois de levemente salgada, a carne cortada bem fininha e temperada com o Chimi-churri, se desfazia com facilidade na boca. Uma delícia...

Resolvemos ainda assar um pernil de cordeiro. A carne de cordeiro não pode ser considerada uma especialidade argentina. Encontramos pratos típicos em todo o sul da Europa bem como nos países árabes. Portanto embora as origens sejam diversas, a influência nos países sul-americanos é inegável e especialmente na Argentina se consome cordeiro com propriedade. Com 24h de antecedência o pernil (1,5kg) foi limpo para tirar o excesso de membranas e depois lavado antes de temperar. O pernil foi “marinado” em uma solução de vinha d´alho (louro, alho, vinho tinto de boa qualidade, pimenta do reino e sal). Utilizei ½ garrafa de vinho, 5-6 folhas de louro, 3 cabeças de alho grande (picado) e sal e pimenta a gosto (eu gosto de caprichar na pimenta). Adicionei também uma ervinhas tipo: manjericão fresco (20-30 folhinhas), e alecrim fresco (se possível) também umas 20-30 folhinhas. Fazer pequenas incisões ao longo do pernil e esfregar a solução vigorosamente por 5 minutos nos dois lados do pernil. Durante a etapa de “marinagem”, o pernil foi regado a cada 2-3h e foi virado na metade do tempo. Daí, cobri com papel alumínio e levei à churrasqueira por algo em torno de 40min a 1h (o tempo pode variar de acordo com o intensidade do fogo). Há amantes de carnes de cordeiro mal-passadas ou ao ponto. Nunca deixe o pernil tostar. É um crime! O excesso de molho foi colhido em uma xícara e foi usado para regar o pernil a cada 10 minutos durante o cozimento (esse pernil também pode ser feito em forno e o tempo de cozimento deve ser ajustado). Retire o papel alumínio na meia hora final para criar uma textura levemente crocante por fora. Fatie bem fino, regue com o molho e sirva-se a vontade!

Para acompanhar, escolhemos vários vinhos Argentinos. Preferimos ficar inicialmente nos Malbec que é uma uva extremamente bem adaptada à Argentina e que gera um vinho normalmente leve que acompanha bem carnes grelhadas, e também massas. Estava justamente dentro dos nossos planos: picanha, pernil de Cordeiro, e Malbec... No mercado nacional uma das melhores relações custo-benefício é o Finca La linda da Luigi Bosca (em torno de R$30,00). Bebemos um malbec 2005 que realmente comprovou que vinhos de boa qualidade não precisam apresentar preços extorsivos. Muito gostoso, uma combinação excelente com as carnes. Um vinho com altos níveis de álcool (14oGL), mas que não alteram o sabor que é bem suave e aveludado. Essa é a dica. Não perca a oportunidade de combinar uma carne grelhada com um Malbec!

domingo, 24 de junho de 2007

A melhor definição de um vinho!

A reunião de amigos antigos com um objetivo comum é intrigante. Normalmente há discussões efusivas, há gargalhadas e histórias, muitas do passado que o grupo viveu. O objetivo comum é, você sabe, comer e beber bem, muito bem (para variar). O motivo é a França. O cardápio principal é “batatê gratinê” e mignon ao duo de funghi e béarnaise. De entradas tivemos endívias ao rocquefort (na verdade, gorgonzola que substituiu muito bem, diga-se de passagem), na farofa de nozes. essa receita é praticamente auto-explicativa. De sobremesa tivemos, ainda, um petit gauteau de chocolat com farofa de castanhas e sorvete de creme. Ufa! Pela cara do pessoal aí do lado ao final da peleja ficou claro que deu tudo certo!



A batata gratinada foi um sucesso. Mais uma receita do mestre Celidônio (sabores do mundo) que ganhou a noite. É simples: basta cozinhar as batatas (1kg, cortadas em rodelas e 1cm de espessura) em uma solução de 800ml leite com noz moscada, sal e pimenta do reino. As batatas devem cozinhar por 15-20 minutos ou até ficarem macias, mas não molengas e se desfazendo. Daí, escorremos as batatas e recuperamos 300ml do leite para fazer o creme. Depois de esfriar o leite, adicionamos uma colher sopa de manteiga e uma colher de sopa de farinha de trigo e mexemos até engrossar. Lembre-se que a farinha deve ser adicionada aos pouquinhos com o creme sempre mexendo para não empelotar. Adicione 250ml de creme de leite fresco e reserve.
Em um refratário, espalhe um pouco de manteiga e alho amassado para untar, coloque as batatas e cubra com o creme. Repita a operação até encher o recipiente. Polvilhe com queijo gruyère ralado (100g).


O filet mignon foi mais simples repeti a receita do molho funghi (veja “Um grande molho de Funghi Porcini” do dia 03/06/2007) e me aventurei no molho béarnaise (também sugerido no receitas do mundo). Devo confessar que o béarnaise não ficou bom. Talvez por não utilizar um batedor manual o molho não engrossou e o vinagre não era de boa qualidade dando um sabor um muito ácido. Por isso nem vale a receita, mas tentarei novamente e se acertar certamente dividirei com vocês.

Os vinhos, uhhmm, os vinhos franceses

O grande destaque dessa orgia gastronômica, com a desculpa de explorar a culinária francesa foram os vinhos. Tomamos vários. Sem nenhuma culpa, ordem ou padrão. Tinha que ser francês! De Bordeaux à Borgonha, mas que não tinha necessariamente passaporte ou origem. Eles foram chegando, passando rapidamente pela adega para uma rápida aclimatação e, voilá, goela abaixo! Entretanto, os franceses mudaram. Por vários motivos, especialmente mercadológicos, pois, nos últimos tempos, vários produtores “cocacolizaram” o vinho e criaram um sabor característico para ganhar o pouco exigente, em termos de qualidade, mercado americano. Por outro lado, a arrogância francesa (e italiana) foi desvelada após a introdução das degustações às cegas, a partir dos anos 70, que mudaram as referências sobre os vinhos do velho e novo mundo. De qualquer maneira, cá entre nós: os vinhos franceses continuam excelentes. Com todos os problemas de mercado e adaptação a ele e a emergência dos novos competidores (de respeito, diga-se de passagem), ainda há uma enormidade de rótulos de qualidade. Tivemos algumas gratas surpresas.


Destaque total para o Chateau D’Arcins Haut Médoc (2004). Sensacional. Tinha uma complexidade, mas não era enjoativo. Bouquet fenomenal, notas sutilmente herbáceas. Na boca era pouco frutado, taninos presentes, sem acidez, ou seja, riquíssimo, mas com a simplicidade que desejamos de um vinho. As vezes a exuberância estraga o sabor. Normalmente, eu não me impressiono com medalhas, mas esse tinha uma de bronze. Merecida! No nosso jantar, não ficou por menos, ele recebeu a medalha de ouro (meio brega, né? É também achei, mas essas pieguices me atacam de vez em quando). O importante que durante o jantar acabamos por utilizar um palavrão muito comum para definir esse vinho. Talvez faça vocês entenderam rapidamente a qualidade do vinho. Foi f...

Depois de sobremesa encaramos o bom entupidor de artérias, o petit gateau de chocolate. Claro que começar a falar de uma receita pela parte negativa, pode ser extremamente frustrante, mas não é o objetivo, apenas um lembrete. As frigideiras ficaram, então, na mão de Adriana Globy que me passou as direções para publicarmos. A receita foi adaptada do site do Olivier. Ela derreteu 120g de chocolate amargo picado em uma panela em banho-maria e juntou 100g de manteiga (50 g de sal e 50g sem sal), mexendo até que ficar um a solução homogênea, lisa e brilhante (é realmente muito bonita). Em uma vasilha, foram batidas duas gemas com ¼ de xícara de chá de açúcar até que os ingredientes tivessem bem incorporados. O chocolate foi retirado do fogo e despejado aos poucos na vasilha dos ovos misturados. Mexemos os ingredientes até que estivessem integrados; e por fim misturamos suavemente 2 colheres de sopa de farinha de trigo e uma pouco de castanha de caju triturada (cerca de 30g). Untamos forminhas pequenas, próprias para petit gâteau, com manteiga e farinha e assamos em forno pré-aquecido a 250ºC, por cerca de 7 até 10 minutos. Para servir as tortinhas de chocolate, acompanhamos com o agradável sorvete de creme que foi, ainda, recoberto de uma deliciosa farofa de castanha (farinha, açúcar e manteiga). Realmente depois de tanto vinho foi um excelente revigorante para uma noite de sonhos bons. Merci.

domingo, 3 de junho de 2007

Um grande molho de Funghi Porcini


Uma das coisas boas dos fungos comestíveis é que podem ser utilizados tanto para molhos de carnes quanto como molhos de massas. Os ingredientes podem ser mudados um pouquinho, mas a essência é basicamente a mesma.
Uma vantagem de se escolher o caríssimo Porcini (R$550,00/kg) é que o cogumelo exala um perfume maravilhoso e é tão macio que para se errar cozinhando-o tem que se esforçar muito.
Resolvi fazer um molho de funghi porcini para carnes servindo a dois. Eu acabo sempre testando todas as receitas com a minha digníssima, Daniela Peres, que é sempre muito elogiosa, embora exista um viés claro em suas opiniões. O molho é simplérrimo: basta lavar o funghi (40g) em água corrente e amolecê-los em 300ml de água morna por 30 minutos. Reserve a água e em uma frigideira de bordas altas refogue ½ cebola e 1 cabeça de alho em 2 colheres de manteiga. Doure as cebolas e o alho e adicione o funghi. Continue o refogado por 3-4 minutos e adicione 1 taça de vinho tinto. Em torno de 300ml bastam. Uma dica importante é a escolha, como diria o amigo Fábio Gouveia, “da melhor relação custo-benefício de qualidade duvidosa”. Usei o Rincon Privado que parece se encaixar nesse perfil (menos de R$10,00 na promoção do Zona Sul). Claro que provei e, de fato, não é um vinho ruim, mas é ralo... Falta paladar, falta bouquet, falta, essencialmente, vinho! Mas confere sabor e tempera bem. Vamos fechar a receita: deixe o vinho evaporar por 3 minutos e adicione a água do funghi. Abaixe o fogo e reduza o volume em torno de 30% (caramba, quanta precisão).
Comece a fritar os bifes. O ideal é usar filet mignon ou picanha com os bifinhos em torno de 1 dedo de espessura (se o Sr. for doutor proctologista não vale, use o dedo de outro). Para os bifes tempere com pimenta do reino moída. Para a porção de molho pode-se fritar até 8 bifinhos de mignon (300-350g) que devem ser fritos em manteiga por 3-4 minutos de cada lado, sem mexer muito, em fogo alto. Depois, os bifes devem ser reservados e levemente salgados, enquanto o molho passa na ferrugem da fritura. Retorne os bifes para a frigideira e aguarde mais 2 minutos e ajuste o sal. Está pronto para servir. Escolhemos de acompanhamento uma massa tagliatelli (250g, de Cecco) que cozinha em 6 minutos. Passe apenas na manteiga após escorrer.
Para o jantar escolhemos um vinho italiano da toscana. Um Chianti clássico, de 1999, chamado de Brolio (R$89,00 na Lidador). Muito Bom harmonizado. O vinho tinha um bouquet exuberante que ganha corpo na medida em que o jantar avança. Isso pode ser um sinal de que o álcool que é perceptível, à 13%, como na maioria dos Chiantis, faz efeito. Um sabor interessante, mas não muito pronunciado. Sem notas particulares, mas direto.
A definição desse jantar foi a boa harmonização do Chianti com os bifinhos de mignon ao molho de funghi. Realmente uma boa combinação como chopp com bolinho de carne seca, Feijoada com caipirinha, Romeu com Julieta e marido com mulher!? Ôpa!

sábado, 2 de junho de 2007

Um novo vinho um grande achado

Outro dia resolvemos fazer uma massinha simples de fácil preparo e que acompanha bem todos os vinhos (ou seria o vinho que acompanha bem as massas).
Bom, resolvemos fazer um pesto de rúcula que ganha do pesto tradicional (manjericão) pela leveza e pelo sabor característico da rúcula (de ligeiro amargor) que é um bom diferencial. O preparo é rapidíssimo: basta bater 20-30 folhas de rúcula sem um cabinho em um processador (pode-se usar o modo pulsar de um liquidificador) com um pouco de sal. Depois adiciona-se 100g de queijo tipo grana (ou grana padano, italiano), ½ xícara de azeite e 50g de castanhas.
Cozinhe cerca de 250g de massa pelo tempo sugerido pelo fabricante. Utilizamos o casareccia-88 (De Cecco). Adicione sal a gosto na água, mas lembre-se que o molho de pesto é levemente salgado. Escorra o macarrão e misture o molho de pesto. Pode ser servido quente ou frio. eu prefiro quente!
Para o acompanhamento abrimos uma novidade do mercado brasileiro, o vinho da uva Ancellotta Dal Pizzol de 2004. Uma boa descoberta! O vinho na casa dos R$35,00 na Lidador do Leblon tem uma coloração púrpura bem escura e sabor forte. Já disse que para mim essa história de pimenta, couro, e caixa de charutos no bouquet é bobagem! De fato mesmo servido aos 16oC o bouquet não é o forte desse vinho, pois ele não era marcante, mas o sabor recoloca o vinho no páreo. Os taninos estavam lá apaziguados, mas presentes. O vinho, ainda, apresenta uma formação de cristais que precipitam. Por isso, o uso de um Decanter é sugerido.
Acho que essa variedade de uva acompanharia melhor uma carne. Mesmo assim, a combinação do Ancellotta com uma massa ao pesto de rúcula se mostrou no mínimo instrutiva. A massa quando misturada ao azeite com o queijo tipo grana é estonteante, e ainda, de brinde, tem um leve amargor da rúcula. Uma receita rápida e saborosa. Boníssima!

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Melhor dia das mães

Se o assunto é boa comida e boa companhia, não posso deixar de contar o melhor dia das mães que passei até hoje na condição de mãe (ok, só foram 3 até agora...). Embora algumas pessoas importantes estivessem faltando, estavam lá as pessoas chaves: minha filha e minha mãe! E o lugar, não podia ser melhor: La Rôtisserie du Beaujoulais em Paris. Um restaurante tradicional e bem conceituado, que pertenceu uma vez ao mesmo dono do Tour d’Argent, esse, como o próprio nome indica, bem mais caro e mais famoso... Chegamos cedo no domingo e pedimos o prato do dia: carneiro assado com batatas. E para acompanhar, a grande pedida dos restaurantes franceses: vinho da casa. Vinho da casa dos restaurantes franceses é que nem água mineral em Caxambu: até a da privada é boa!

Antes do prato principal chegar nos deliciamos com um pão maravilhoso e manteiga igualmente. Tínhamos acabado de vir de um longo passeio a pé, quando vimos a Notre-Dame e uma feira de plantas e animais, na própria Ile de La Cité. Ainda ecoava nas nossas cabeças o coro que ouvimos lá dentro, impressão ampliada pela grandiosidade da catedral. Admirávamos seus altíssimos arcos góticos e belíssimos vitrais.

Voltando ao almoço. Nunca tinha provado carne de carneiro tão macia! Meu querido amigo Milton prepara uma impecável, mas infelizmente é limitado pela matéria prima que se pode conseguir aqui. Lembrem que o nome do restaurante é
Rôtisserie, então eles sabem fazer isso. As batatinhas também não ficaram atrás, e o vinho...

De lá seguimos andando e atravessamos a Ile de St Louis até Rive Gauche. Na Place de Vosges havia um parquinho e enquanto a pequena brincava podíamos ouvir música clássica sendo tocada ao vivo ali perto. Enquanto elas ficaram lá eu fui até o
Museu Picasso, que estava com uma exposição sobre sua relação com a Espanha, chamada Carmem. Lembrei muito da Dani! E aprendi que Picasso fez de tudo um pouco, além de pintar: cerâmica, fotografia, esculturas e até desenhar figurino para peças!

Um dia das mães único e, portanto inesquecível. E devo isso a minha querida mãe, que nos proporcionou essa viagem cheia de experiências incríveis que marcam a vida da gente. E não é isso também que mãe faz? Quero ser que nem você quando eu crescer.

sábado, 26 de maio de 2007

Bioletim e Rio Sol


Ontem fomos almoçar na Casa de Chá da Fiocruz eu, Milton, Marília e Fábio Gouveia. O motivo era dos mais nobres: Vamos re-editar a revista de divulgação científica Bioletim.

Como a ocasião pedia e o orçamento permitia, resolvemos pedir um vinho. A única opção (pequena falha do mais que agradável Quiosque da casa de chá) era um Rio Sol Assemblage 2003. Milton se arrepiou todo ao saber que era do Vale do São Francisco. Não queria nem ouvir falar dos vinhos de lá. Eu também tive recentemente uma experiência ruim com um vinho de lá. Não lembro o nome, mas o rótulo é tão cafona, tão cafona, que não tem chance de eu não reconhecer e tomar por engano novamente.

Mas eu ainda tenho em casa uma garrafa de Rio Sol Reserva Syrah 2003 dada pelo meu tio.
As duas primeiras foram boas experiências e eu falei pra gente pedir uma taça (que veio muuuito gelada). Era um assemblage, mas não dizia quais as uvas. Descobri depois que se trata de 50% Syrah, 35% Cabernet Sauvignon e 15% de Alicante Bouschet. Não era reserva mas era justo pelos R$25 que custava (porque estavamos no quiosque. com R$25 você compra coisa muito melhor no supermercado).

Foi uma reunião incrivelmente produtiva e divertida, como acontece quando a gente mistura 4 cérebros funcionantes e um pouco de Baco. Como deveria ser nos tempos de Oswaldo.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Introdução aos vinhos!

Eu gosto da idéia de encontrar pessoas e não apenas ter compromissos ou reuniões. Essa é grande diferença desse espaço. Agora, tenho que confessar uma coisa: embora a noite do México tenha sido interessante, faltou uma coisa, o vinho. A bebida de coloração púrpura ou violácea (ou mesmo esverdeada cristalina no caso dos brancos) é, de fato, a bebida mais adequada quando pensamos em encontrar pessoas e enveredar por debates acalorados sobre a existência da vida em outros planetas, ou mesmo reles temas cotidianos como futebol, política e romances ligeiros. Afinal, em todos os grupos (talvez exceto os ingleses) as conversas regadas a vinho sempre terminam em conversas interessantes embora muitas vezes tenhamos dificuldade em lembrá-las. Mas não vamos perder o foco.
Uma das idéias desse blog é criar um espaço para conversar com antigos e novos amigos sobre as boas coisas da vida: gastronomia, vinhos (embora outros fermentados e até destilados também estejam na lista). E o desafio era pensar em criar um lugar para trocar informações sobre boas receitas e bons vinhos que não sejam de alto custo. Pois bem. O blog representa apenas um receptáculo universal em busca de boa comida, bons vinhos e, sobretudo, que valorize a boa companhia.


Hoje a idéia e descobrir um prato Peruano com muitas brasilianadas, o ceviche. Para acompanhar escolhi um vinho Chileno Missiones Sauvignon Blanc 2005 (em torno de R$27,00 no Zona Sul). De fato a escolha de um vinho do país vizinho pode acirrar o ciúme nos Peruanos que ficam bravos com a popularização da idéia de que o Chile é o verdadeiro “inventor” do ceviche. Até o Pisco Sauer que também é Peruano passou a ser conhecido como uma bebida Chilena. Parece que popularidade dos vinhos do Chile arrebatou para eles todas as qualidades da culinária da região.
O ceviche é um excelente prato a base de peixe “cozido” no limão que serve muito bem de entrada ou mesmo como um pratinho principal leve. Vamos à receita: pode-se escolher qualquer peixe: branco, atum, ou salmão, embora eu prefira o último (300g) que devem ser fatiados como para um sushi, acomodados em uma vasilha e banhados no suco de 2-3 limões taiti grandes (o suficiente para cobrir todas as camadas). Deixe o salmão cozinhando por 30 minutos. Paralelamente, coloque 2 batatas médias sem casca para cozinhar em pedaços heterogêneos. Prepare o molho com 2 tomates sem caroços em pedaços pequenos, coentro e cebolinha cortadinha bem fina e ½ cebola grande processada. Descarte o limão do salmão e fatie-o mais um pouco, misture com a batata cozida, e adicione o molho. Tempere com Shoyu (4 colheres), suco de ½ limão e 4 colheres de azeite. Adicione pimenta a gosto. Misture bem. Pode ser armazenado por 30 min - 1h na geladeira. Salpique com algumas castanhas de caju para decorar e está pronto. Para servir utilize folhas de alface americana ou endívias. O vinho é bom e acompanhou bem o ceviche. Servido gelado (em torno de 10oC) é leve e não agride o paladar ácido da mistura de limão com Shoyu.
Eu ainda não mencionei, mas embora me considere grande admirador de vinhos não sou chato. Portanto não esperem sessões explicativas sobre bouquet rico em frutas cítricas (ou vermelhas quando falarmos de tintos), ou sobre a textura do vinho. Na verdade o que é a textura do vinho?! Sempre achei que vinho fosse líquido... Claro que outras características físico-químicas também podem ser percebidas (adstringência, graduação alcoólica, etc). De qualquer forma não repreendo os “enos”. Pode ser divertido tentar perceber aniz, pimenta ou uma caixa de charutos usando olfato ou paladar. Eu simplesmente não acho que esse deva ser o ponto principal. Independentes disso, obviamente os vinhos são bons ou ruins, às vezes, são medíocres, regulares, mas podem chegar ao outro extremo: excelentes.
Muito bem, como a idéia geral é comer e beber bem, experimentem a sugestão: o ceviche com vinho branco é um grande encontro.

sexta-feira, 4 de maio de 2007

Margaritas ou Margueritas?


Pois é! Margaritas ou Margueritas? A primeira é a bebida Mexicana e a segunda é a pizza original da Itália. Na verdade, não importa... A bebida precisa de uma mistura de Tequila, um destilado de cactus (1 parte), e mais 1 parte de licor triple sec (Cointreau ou Gran Marnier) e ainda a mesma quantidade de suco de limão e gelo picado. Essa é apenas uma das possibilidades. Alguns gostam de adicionar açúcar (1-2 colheres a gosto) ou mesmo um mistura de água com açúcar. A receita que estamos disponibilizando sem açúcar é de fato muito boa. simples. Um toque especial pode ser dado com a adição de sal na borda da taça que será servida a bebida. Sensacional!

Começamos bem o jantar Mexicano. Como a experiência de cozinhar a especialidade do país de Diego Rivera e Frida Khalo é praticamente nenhuma decidimos seguir as sugestões do mestre José Hugo Celidônio em uma publicação no Jornal O Globo de cozinha internacional. Escolhemos as tortillas de peixe. Uma receita simples, de fácil execução. Brevemente: o filet de peixe branco (congro, linguado, etc) deve ser rapidamente cozido em banho de água com sal e pimenta a gosto por 5-10 minutos. Uma proção de 400g deve servir bem 4 pessoas. O "sour cream" é feito com a mistura de creme de leite (fresco) na razão 2:1 com suco de limão e uma pitada de sal.


Depois então refogamos ½ pimentão vermelho com ½ cebola em azeite e misturamos o peixe e o “sour cream”. A dica é misture o peixe e depois adicione em partes o “sour cream” até que fique com o sabor que lhe agrade. Esse é o recheio que deverá ser colocado nas tortillas (simplérrimo: ½ kg de farinha de trigo 3 colheres de margarina e uma pitada de sal e mais 125ml de água: misture os ingredientes exceto a água que deverá ser adicionada aos poucos. Descanse a massa por 30 minutos e depois abra com o auxílio de um rolo de pastel. Asse sem gordura e separe). Enrole as tortillas com o recheio e adicione queijo tipo emental ralado para selar a junção das tortillas e leve ao forno até derreter o queijo (10-15 minutos). Agora, relaxe... Basta se deliciar com margaritas e tortillas de peixe! Macias e com sabor levemente adocicado esse foi o prato da noite. Claro que tivemos Guacamole, pica de galo e vários outras aperitivos para comer com nachos. Muito bom também, embora não tivesse tão especial. Para ser muito sincero, dificilmente um mexicano teria gostado desse jantar, especialmente porque fizemos tudo com pouquíssima pimenta, mas isso não é o mais importante. Para nós cariocas estava uma delícia! Esses pedacinhos do México (abrasileirado) no coração do Rio, mais especificamente no Flamengo, estavam especiais. Viva a gastronomia do país dos Mariachi. Viva o México!


Confraria da Boa Companhia

O que precisa pra fazer um blog? 5 min e uma boa idéia. E que idéia melhor do que juntar os amigos pra comer e beber? A Confraria da Boa Companhia começa assim. Estamos aqui, Mauro e Milton, M&M pros íntimos, preparando o jantar dessa noite que tem tema mexicano. Daqui a pouco a gente conta como está sendo ou como foi. Esse espaço é pra isso, contarmos dos bons vinhos, cervejas e comidas que preparamos ou provamos. Beijos, M